sábado, 27 de outubro de 2012

As funções da rádio


 

Pilares da comunicação social
Rádio – Os propósitos de quem faz e quem ouve
As funções da rádio
As funções intelectuais
Os tipos de conteúdos da rádio
Os tipos de conteúdos da rádio +As funções persuasiva, entretenimento, formativa, informativa
Forma de consumo da rádio
A retórica radiofónica

Maletzke (1976) afirma que os pilares da comunicação social são: a) a transmissão pública de mensagens; b) de forma indirecta e unilateral; c)realizada por meios técnicos; d) e para um público disperso ou em comunidade. A comunicação social é pública, pois, caso contrário, já não será comunicação social e tem de ser dirigida a uma massa humana dispersa. Jamais poderá ser uma comunicação dirigida em ambiente privado e para um escasso e reservado grupo de receptores. O seu acesso é público, nunca limitado e, para além disso, as mensagens veiculadas através da comunicação social são indirectas porque acontecem num espaço temporal e/ou espacial, entre quem emite e quem recebe. Por não permitirem o intercâmbio, diz-se serem unilaterais i.e. apenas têm um sentido. O público-receptor está disperso e, apesar de constituir uma comunidade, não são um grupo organizado em comunidade fechada para quem as mensagens se destinam.
Os elementos aqui apresentados, permitem perceber que os profissionais dos meios de comunicação social, com papel de emissores no acto comunicativo que se desenvolve entre os media e os sujeitos, têm a necessidade de serem bons comunicadores. Os bons comunicadores que são os que percebem as características dessa comunicação e se adaptam às várias circunstâncias, têm o trabalho facilitado.
Por se tratar de um medium onde a mediação tecnológica é menos perceptível, ao profissional da rádio são acrescidas as exigências de ter de ser um bom comunicador e como diz Arturo Merayo a rádio é “el medio de comunicación social que mejor puede comunicar” (2003: 09).
As características atrás definidas como pilares da comunicação social estão espelhadas na rádio, mas é necessário ir um pouco mais além e perceber algumas questões relativas à relação que se estabelece entre quem emite e quem recebe a mensagem que é difundida pela rádio.
Comecemos por perceber qual o propósito, ou propósitos, que estão na rádio. O propósito, como intenção ou ânimo para a execução de uma determinada tarefa, quando aplicado à comunicação social é algo que faz parte da esfera do sujeito, quer seja o emissor ou o receptor da mensagem, neste caso locutor e ouvinte, respectivamente. Assim, o propósito é a intenção que o emissor e o receptor colocam no acto comunicativo, e que justifica a participação de cada um na comunicação. É uma volição que por vezes pode não se concretizar. É uma liberdade que estes sujeitos têm em relação ao media que poderá ou não concretizar-se.
O primeiro propósito de quem é emissor através da comunicação social é atingir o maior número possível de pessoas, i.e. ter o maior auditório possível. Para além disso, ao emissor pede-se perspicácia para influenciar através da comunicação. Para tal, é necessário um conhecimento profundo e apurado das características do auditório que se pretende influenciar, e, para além disso, ter a capacidade de adaptar a mensagem ao meio e ao auditório. Sobre este assunto, o Arturo Marayo tem um curioso exemplo ao dizer que “un programa radiofónico sobre precios agrários estará dirigido a los campesinos – receptores intencionales – y en función de ello se hace uso de um lenguaje determinado.” (2003: 12) e diz mais ao afirmar que “toda a conducta de comunicación tiene por objeto producir una determinada respuesta por parte de una determinada persona...” (2003: 12). Do lado do receptor, o propósito poderá ser intencional ou não intencional, e neste último caso não existir uma intenção directa de escutar a mensagem difundida.
Outro aspecto importante, passa por perceber qual a função, ou funções, da rádio. Não é perceber o ‘para que serve?’ ou ‘para que se quer?’ a rádio, mas sim, perceber qual a sua função no contexto de relação entre a pessoa que é emissor e o medium, ou, entre o emissor e a pessoa que recebe a mensagem. Assim, as funções relacionam-se com uso atribuído ao media por parte de emissor e receptor, pelas diferentes motivações. As funções dividem-se em dois campos: vitais e intelectuais. As funções são consideradas vitais quando consideradas essências para a vida humana e  preservação da espécie (neste caso da espécie humana). São as funções biológicas, psicológicas e sociais que tem aqui o seu enquadramento pelo facto do Homem não ser um animal gregário, de viver em comunidade e de ser vital para a sua existência a necessidade de comunicar. Por sua vez, as funções intelectuais estão relacionadas com o informar, o formar, o entreter e o persuadir. Aprofundemos um pouco mais estas últimas.
Na relação com as funções intelectuais, os conteúdos da rádio podem ser de quatro categorias: informativos, persuasivos, formativos/culturais e de entretenimento. É impossível a criação de um conteúdo de um único tipo, apesar de existir sempre uma categoria dominante. Para alem disso, a forma do receptor identificar a categoria dos conteúdos poderá variar, criando uma divergência de opinião entre emissor e receptor, ou até mesmo entre receptores.
Mas vejamos um pouco melhor cada um dos tipos de conteúdos que atrás apresentámos.
Tal como em todos os actos de comunicação, também na rádio as mensagens têm o objectivo de persuadir, “el intento persuasivo existe siempre, aunque se trate unicamente de llamar la atención sobre el mensaje, bien para estimular a la compra del producto comunicativo o para atraer el interés sobre aquél en el caso de los médios gratuitos, como es la rádio” (Merayo, 2003: 12). A retórica, que não é algo exclusivo de textos literários,  desempenha, aqui, um importante papel para que o discurso possa comover e entusiasmar. Este uso retórica tem três categorias: Delectare, que é a tentativa de persuadir através da diversão; Docere, que é um apelo à razão; e Movere, que é dirigir-se aos afectos. Por estarmos a falar de uma comunicação colectiva, o ponto de partida é sempre o Movere, que se torna mais exigente no caso da comunicação através da rádio por ser um meio limitado onde se verifica a total ausência da imagem e onde os recursos são escassos[1] e limitados à voz, ao silêncio e à música, “desde el primer momento de cada programa y a lo largo de todo él, captar la atención del publico: conseguir que no huya a otro punto del dial, que permanezca en la escucha, ha de ser el primer y principal objectivo del emissor radiofónico” (Marayo, 2003: 21). Estas exigências provocam a necessidade de uma maior eficácia do emissor acrescentada pelo facto da ausência do elemento visual tão atraente nas sociedades contemporâneas.
O facto da rádio ter um carácter de gratuidade constrói junto do receptor uma pré disposição própria para alterar a forma de consumo. Apesar do aparelho receptor ser pago[2] e de em alguns países os cidadãos terem de pagar uma taxa/imposto de financiamento para a rádio, a verdade é que a rádio tem uma componente de gratuidade. Noutros media, onde se efectua o pagamento dos conteúdos, o consumidor está condicionado à mudança pelo pagamento que fez e comprometido com a compra efectuada. É o que se passa com a música que passa numa estação de rádio, que quando não é do agrado de quem a escuta, a reacção é mudar de posto e procurar uma rádio com uma música do agrado do receptor (processo cada vez mais facilitado devido aos receptores digitais em relação aos antigos modelos analógicos com recurso a um ponteiro e a um sistema mecânico para a sintonia). No entanto é pouco provável que o leitor de um jornal por não gostar de uma reportagem inserida no jornal, o largue e vá comprar outro jornal. O que este leitor faz é mudar de página e continuar a consumir o jornal que comprou.
Os profissionais de rádio, principalmente os que são emissores das mensagens difundidas pelo canal, devem ter em conta a necessidade de persuadir, de fixar o auditório em cada momento, porque o que atrás dissemos sobre a facilidade de mudar de posto emissor faz com que seja necessária uma atenção muito forte a cada um dos instantes/tempos de emissão que origina que a rádio não possa perder de vista a retórica, que para alem das estruturas aplicadas à linguagem também deve ser uma retórica musical. (Merayo, 2003: 21). Ainda sobre este assunto, destacamos as palavras de Moragas Spa (1980: 239) ao dizer que “entre las possibilidades retóricas instantâneas resaltan todos los médios particulares de su componente hablada: la entonación, el acento, la admiración, y figuras retóricas como la ironia, el discurso socarrón, las burlas, la euforia reconocida por um determinado falsete en el torno de la voz (...) la seguridad (...) la rapidez en la pronunciación (...), el tono melancólico (...), el acento afectado, lento, grandilocuente (...) la euforia e lo que denominaré énfasis del próprio nombre”.
Em toda esta temática da capacidade persuasiva da rádio devemos também de abordar a utilização da rádio para fins de promoção de ideias politicas, religiosas e a própria publicidade, casos existem, como no passado o III Reich[3] e outros mais contemporâneos como a utilização de rádios por seitas religiosas.
Quando o Movere, que repetimos é dirigir-se aos afectos, é atingido, é que se pode passar para o Delectore, que é tentar persuadir pela diversão.
Passamos para a função de entretenimento.
A rádio é o meio predominantemente para o entretenimento. Recorrendo a Arias Ruiz, “la radio es distracción, espectáculo a domicilio, siempre amena pêro nunca vacía de contenido” (1964: 112-113). Ao ouvinte não se pode exigir esforço na sua concentração de audição, o aparelho de  rádio, por vezes, é apenas um electrodoméstico que está ligado a debitar som mas com ausência total de concentração por parte de quem a escuta. Assim, o produtor dos conteúdos tem de perceber que não pode solicitar esforço de audição ao seu auditório, e que muitos dos que o estão a ouvir na verdade estão concentrados no desenvolvimento de uma outra qualquer tarefa. Até nos noticiários, o incremento de aspectos relacionados com curiosidades ou apontamentos de boa disposição poderão servir para a diminuição da tensão quando bem colocados na mensagem.
Repetimos que em nenhum caso se está a dizer ou a referir que o facto da rádio ser um medium com esta característica seja desprovida de conteúdo e seja vazia.
Mas a rádio, apesar destas características associadas ao entretenimento, também tem espaço para uma função formativa, que logicamente a tem, apesar de “no se facilita uma formación igual cuando se difunde una información superficial, ligera y precipitada, que quando esta es profunda contrastada y rigurosa” (Merayo, 2003: 24). No entanto esta função, de acordo com Sanabria Martin acontece quando enriquece cognitivamente o pensamento social, político, económico e artístico dos receptores.
Em alguns momentos o receptor está disponível para efectuar um esforço na concentração aplicada ao acto da escuta da mensagem radiofónica, e, nesses casos, a formação dá-se não só apenas pelo conteúdo mas também pela maneira como esses conteúdos são elaborados e apresentados, “no se debe minusvalorar ni mucho menos olvidar el carácter puramente estético que puede aportar la emisión radiofónica” (Merayo, 2003: 25). A formação também pode ser concretizada nos próprios boletins de notícias, pela própria publicidade emitida e outras mensagens.
Por fim abordaremos a função informativa, onde as questões estéticas e de diversão, até aqui enfatizadas, passam para um segundo plano. Aqui, o que conta é a importância e a utilização prática da mensagem. Apesar do Homem desejar estar cada vez mais informado, e justificado por aquilo que já escrevemos, esta não é a função primordial da rádio, apesar de em alguns casos ser a predominante.
JB - Outubro de 2012

Bibliografia:
Merayo, Arturo (2003). Para entender la rádio. Salamanca, Publicaciones Universidad Pontifícia de Salamanca.
Martín, Francisco Sanabris (1974). “Radiotelevisión, comunicación y Cultura”, Confederación Española de Cajas de Ahorros. No.58, Madrid
Meletzke, Gerhard (1976). Psicología de la comunicación social. Quito, Ciespal
Moragas Spa, Miquel de (1980). Semiótica y comunicación de massas. Barcelona, Península
Ruiz, Aníbal Árias (1964). Radiofonismo. Conceptos para una radiodifusión española. Madrid, A. Vassalo.




[1] Sobre este assunto Arturo Merayo chama à rádio um medio ciego.
[2] Situação cada vez mais pontual pelo crescimento da audiência de rádio pela internet em relação aos tradicionais modelos de escuta.
[3] Em particular com o programa de radio Stunde der Nation – A hora da nação

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